EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

sobre a masturbação (parte II)...

Não falarei de orgasmos.
O orgasmo é o ato final da masturbação, o ápice. Mas dura tão pouco, que depois as recordações que permanecem são as dos momentos que precedem o gozo, as lembranças do toque, do cheiro, da intensidade.
Gosto quando, despretensioso, ele se toca enquanto conversamos, como se estivéssemos falando banalidades. Gosto quando, de repente, o silêncio ou a concentração são cortados por ofegos e grunhidos quase imperceptíveis. Gosto quando, desafiador, ele propõe - com os olhos faiscantes - que eu leve a mão ao centro do meu corpo e descubra a cova macia e úmida.
E é assim, com os dedos afogados no mar de paredes acolchoadas, que me descubro, me desfaço, me refaço; me destruo e me recomponho. É acariciando o pequeno monte nervoso que ouço o rosnar, o arfar, as súplicas. É a respiração crescente que me acende, meu combustível. É o momento em que realizo a minha fantasia de vestir a pele do outro para saber como é estar em mim, dentro de mim.
É exatamente quando me masturbo que sinto a crueldade transformando o amor em tormento, suplício, angústia, dor. E enquanto os dois opostos se deliciam com a sofreguidão do outro, aproxima-se o instante em que toda a aflição convergirá para um único momento: a paz mútua.

3 comentários:

E agora José? disse...

Estou ansioso para ler essa continuação...

E agora José? disse...

Você é afiadamente inteligente e sabe descrever sensações como poucos podem. O centro feminino por si só já é original, mas você vai além e nos mostra todo universo que a força da mulher carrega consigo indo para muito longe do que se pode esperar.

Seduz com as palavras e escreve na medida certa. No entanto, embora a qualidade sempre seja muito boa, quando menos se espera você age como uma fera e surpreende no que não parece ser mais possível ser digno de fascínio. Esse texto é um desses casos.

Tudo que fiz foi um desafio, um pedido, uma chance de dizer algo novo sobre um mesmo tema. Joguei para o ar uma moeda e você me cobriu com uma chuva de palavras preciosas. Ficou extremamente lindo esse texto, sem pudor, sem convenções, sem querer chocar; simplesmente a verdade lapidada pela habilidade genuína, um diamante que nos obriga a ler, reler, reler... Seu texto masturba os olhos do leitor.

A descrição do sexo feminino e do toque dos "dedos afogados no mar de paredes acolchoadas..." demonstra como você pode se superar na descrição do corpo sem se apoiar nas metáforas e vocabulário que já domina. Você conquista mais e mais o texto e a linguagem e desenha com a língua a imagem que quer na cabeça do leitor.

"Vestir a pele do outro" essa parte é de uma poesia maravilhosa, porque não se refere só ao ato de sentir a sensação da outra pessoa, é amar-se, é se conhecer, se aceitar. Envolve um autoconhecimento, uma honestidade quanto a seu corpo e a sua sexualidade que nos faz olhar para nós mesmos e tentar desvendar os tabus que carregamos para podermos sentir essa liberdade encantadora que você canta pelas frases.

Embora esse texto pareça um colar de pérolas, o desfecho é realmente onde ele ganha o status de obra-de-arte.

"a crueldade transformando o amor em tormento, suplício, angústia, dor. E enquanto os dois opostos se deliciam com a sofreguidão do outro, aproxima-se o instante em que toda a aflição convergirá para um único momento: a paz mútua"

Raros são os autores universais que são capazes de em tão poucas palavras trazerem para os sentidos do homem moderno a sensação palpável do prazer como você fez.

E mais, com a beleza e delicadeza feminina que faz de você Andressa Furtado, uma escritora inesquecível, deliciosamente indecente, absurdamente sensorial e que transforma a palavra, em ação interior possível de ser compartilhada por todos.

Você fala a língua da alma e isso é eterno e onipresente. Musa, mulher, esfinge. Mesmo que eu não te amasse, eu não poderia deixar de me ajoelhar ante a sua pena. Porém, eu te amo muito, e reitero cada palavra aqui com a confissão de que sou o seu maior admirador.

I'm Nina, Marie, etc... disse...

Depois de todo esse comentário elogioso, eu quase fiquei de pé para me aplaudir em frente ao espelho... :)
Thanx, babe...