EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Parede

Eu te vejo aproximar-se de meus pés. Seus pés aproximam-se dos meus. Nossos pés encaram-se. Olho para cima e te vejo gigante. Descalça estou, descalça permaneço. Meu nariz para cima apontado mira na direção do seu queixo. Seu queixo sorri para meu cabelo desalinhado.
Seus pés avançam mais um pouco. Vou recuando. Recuo e encontro a parede. Seus dedos buscam meus pulsos e os erguem acima de minha cabeça. Seus lábios sorriem de um lado só. Não é um sorriso, é um desafio semisorridente.
Você avança e me encurrala na parede. Sinto algo pulsando contra minha barriga. Jogo-me para frente, abusada. Você força mais minhas mãos contra a parede. Mexo os quadris e dou uma risadinha petulante, tentando fazê-lo soltar minhas mãos, ocupando as suas com meus seios. Mas você não me deixa ir. Segura, então, meus dois pulsos com apenas uma mão. Você é forte. Seus dedos livres invadem meus lábios - os do rosto, primeiro - buscando minha língua. Teu corpo me esmaga contra a parede. Teus dedos me abandonam a boca e são substituídos pela tua própria língua, que me lambe rosto, orelha, pescoço, cabelos. O esfregar da sua barriga na minha deixa-me molhada, em prantos entre as coxas. Como chora o sexo, como queima o amor...
Lembro-me da primeira tarde, quando me puseste na mesma posição. Mas agora não me deixas mais escapar, fugir, encenar. Sua mão livre agora levanta meu vestido e puxa para o lado a calcinha que se afogava no meio de minhas pernas. Seus dedos encontram outros lábios. A ponta de seu dedo médio dança com essa pequena pérola encarnada que guardo nessa boca não menos vermelha. Meus joelhos falham, dobram-se, mas você me segura entre suas coxas. Seu dedo me dá pequenos choques e um queimor estranho se desfaz para fora de mim. Não sinto minhas pernas, acho que vou morrer. Teus dedos abandonam-me novamente e seu jeans escorrega pernas abaixo. E agora, livre, você namora meu umbigo, fazendo-o refém daquele desejo seu. Nossas coxas conversam, espremem-se, encolhem-se e se expandem à medida que dançamos. Fotografo teus olhos e tua boca murmurante de lábios rachados.
Teu sexo transpira em meu umbigo, rindo para mim. Levanto tua camisa e encontro teu peito perdido entre pelos e mamilos que cumprimento com minha língua. Teus mamilos respondem, atônitos. Apontam para mim, ousados.
Nossos sexos dialogam entre fluidos monólogos. Encaixes perfeitos, queimor lento e absurdo. Engolem-se. Engulo-te. Coxa levantada, parede maltratada. Uma batida e um suspiro, outra batida e um sussuro. Gemidos. Cadência aumentada. Galope. Caímos. O chão agora é o apoio de tuas costas, e eu, amazona, desfaço-me faceira. Tuas mãos, teus milhares de dedos estão por toda parte. E enquanto incha me acarinhando por dentro, presenteia-me com um colar de dedos a me asfixiar suavemente, derretendo-me inteira da nuca ao ventre, em espasmos encharcados de espuma branca e espessa derramada no fundo da concha venusiana, no centro do mundo, no meio do amor.

Um comentário:

E agora José? disse...

Os nossos corpos falam, conversam, se desejam. Adorei, contra a parede, sem defesa a gente dialoga em fluídos monólogos. Precisamos conversar assim mais.