EGO

"Eu não sou promíscua. Mas sou caleidoscópica: fascinam-me as minhas mutações faiscantes
que aqui caleidoscopicamente registro."

(Clarice Lispector)

sexta-feira, 28 de setembro de 2012

seres

Deslizo a ponta do dedo médio na borda do copo lentamente, esperando que algum som venha romper o silêncio da sala. Há apenas a música que toca em minha cabeça e o silêncio ensurdecedor do lado de fora. São dois ambientes que não se misturam por completo - o lado de dentro e o lado de fora do corpo. E o lado de fora é oco, por mais estranho que possa parecer, enquanto meu interior ebule em maciez e doçura - porque hei de ser doce e suave em meus desatinos. E quando meus olhos cerram-se na noite do meu espírito partido, as trevas me engolem inteira pra tua morte, pro teu desespero homicida de me querer mais que me amar, de me destroçar em partes que não se reunem novamente, de me pulverizar no meio de tua fome, de tua miséria, de teu desengano. E já não sou mais eu, então. Sou tuas vísceras. Sou tua saliva. Reviro teu estômago com força mas não quero que me regurgites. Sou umas dores que se espalham pelo teu corpo, pelas tuas veias bailarinas de homem nu. Sou aquela droga que te acelera o pulso e te dilata a pupila - aquela adrenalina que bebes a goles largos em noites cinzas. Um movimento bruto enlaça nossos desejos mórbidos de seres distintos. 
Sou inteira teu rancor e tua matança.
 

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

sem título X

era sutil o querer do tempo
querer sem tempo
de tempo velho
e  querer moço
roçar de brisa
em sol de outono
meia-luz
vinho-sangue
amor tinto
lençol alvo
palavras, silêncios
desejos
carne trêmula
boca
amor
e mais nada.

quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Javier Velaza

No es inútil amarse,
finalmente.
Lo mismo que amaestrar serpientes, nos exige
técnica refinada y perder la vergüenza
de actuar frente al mundo en taparrabos.
Y unos nervios de acero.

Pero amar es oficio
saludable también: su liturgia apacigua
el ocio que enajena -como supo Catulo-
y perdió a las ciudades más felices.
Bajo la cuerda floja dispone -no pidáis
una red, porque tal no es posible- otra cuerda,
pero última
tan floja,
tan inútil a veces,
bajo la cual no hay nada.

Y entreabre
ventanas que te oreen la cólera y exhiban
a tu noche otras noches diferentes, y así
sólo el amor nos salva a fin de cuentas
del peligro peor que se conoce:
ser sólo -y nada más- nosotros mismos.

Por eso,
ahora que está ya dicho todo y tengo
un sitio en el país de la blasfemia,
ahora que este dolor de hacer palabra
con el propio dolor
traspasa los umbrales
del miedo,
necesito de tu amor como analgésico;
que vengas con tus besos de morfina a sedarme,
y rodees mi talle con tus brazos
haciendo un salvavidas, para impedir que me hunda
la plomada letal de la tristeza;
que me pongas vestidos de esperanza -ya casi
no recordaba una palabra así-,
aunque me queden grandes como a un niño
la camisa más grande de su padre;
que administres mi olvido y el don de la inconsciencia;
que me albergues de mí -mi enemigo peor
y más tenaz-, que me hagas un socaire,
aunque sea mentira
-porque todos es mentira
y la tuya es piadosa-;
que me tapes los ojos
y digas ya pasó, ya pasó, ya pasó
-aunque nada se pase, porque nada se pasa-,
ya pasó,
ya pasó,
ya pasó,
ya pasó.

Y si nada nos libra de la muerte,
al menos que el amor nos salve de la vida.


[El salvavidas - Javier Velaza]

terça-feira, 11 de setembro de 2012

poema de morte em manhã de inverno

entre tanto querer
entre tantos dias
havia de ser o querer de morte
a excitar-lhe os nervos
a antevisão dolorosa
de um fim próximo a outro início
entremeios nevrálgicos
e submersos
submundos
sub-humanos
marginais em seus desejos imundos
de morte em manhã de inverno.